sábado, julho 08, 2006

O CHUCK BERRY DO SAMBA


por Affonsinho

John Lennon, em uma de suas inúmeras e polêmicas entrevistas, deixou no ar a seguinte frase :
- "se tivessem que dar um outro nome para o rock'n roll acho que deveria ser : Chuck Berry.
Concordo totalmente. Tive a sorte de assistir ao show de Berry, o mito, aqui mesmo em Belo Horizonte, na primeira fila, há alguns anos. Quem perdeu, perdeu. Foi fabuloso !
Muita gente sabe que o rock'n roll já havia sido descoberto por uma certa turminha, antes dos brancos, da mesma forma que o Brasil já era bem vivo antes dos portuguêses. Chuck, realmente, foi o grande poeta do rock. O criador dos famosos riffs de guitarra que influenciaram mais de meio mundo. Uma espécie de professor dos próprios Beatles, Stones, Dylan, e até mesmo de Caetano e Gil, que receberam valiosos toques do grande letrista.
Também já ouvi dizer que o rock não é somente música : é atitude. Então tá. Temos aqui uma espécie de Chuck Berry, só que de um jeito diferente, tropical, manhoso, repleto de balanço e que, mesmo sendo de um dos poucos países onde o idioma é o português, transformou os rumos da música mundial, com seu jeito único de fazer arte.
Escreveu pouquíssimas canções, mas gravou várias e deu a elas a novidade necessária para que chegassem ao outro lado do planeta causando impacto. No princípio poucos o compreendiam e até hoje muitos no Brasil ainda ficam meio assim, sem saber direito se o cara é bom mesmo ou se é pura invenção da mídia. Da mídia não, porque ela fala quase nada sobre ele. Alguns artistas e poucos críticos musicais são seus grandes "compreendedores".
Nas últimas décadas, muito daquela atitude do rock'n roll foi trocada por cabelinhos, roupinhas e pelos popezinhos descartáveis das Patys e Mauricinhos das Beverly Hills do Brasil. Ainda bem que o Cazuza deixou a frase : "Ideologia, eu quero uma pra viver." Apesar de tudo, ainda conseguimos encontrar poucas, mas boas bandas, cheias de atitude por aí. Nem sempre na mídia, mas zanzando pelos pequenos palcos e - insistindo em mudar o mundo !
Interessei-me pela música por causa do rock'n roll, num tempo em que praticamente só existiam professores eruditos em Belo Horizonte. Tínhamos que adivinhar, da primeira fila do Teatro Francisco Nunes, o que faziam os dedos dos músicos dos Mutantes, do Terço e do Tutty Frutty. Esperávamos a parte final do show, quando algumas poucas pessoas se levantavam e iam dançar lá na frente. Então chegávamos mais perto e fotografávamos, com os olhos, as frases de guitarra que tentávamos reproduzir em casa, em cima dos LPs. Era pura adivinhação ! Nunca vou me esquecer da noite em que ví o Pardal, guitarrista da banda Saecula Saeculorum, (que se transformaria mais tarde no Sagrado Coração da Terra), fazendo o vibrato com o dedo, sem usar a alavanca. Para mim foi pura mágica !
E alguns artistas são realmente mágicos. O Chuck brasileiro é um desses. Foi abençoado diretamente pelos anjos, mas deve ter gasto inúmeras horas trabalhando as mãos para alcançar o Paraíso de ritmos que inventa em cada acorde. Sim, porque o dom não foi dado a ele de bandeja. Descobriu o segredo depois de muita transpiração. Suou a camisa em vários lugares do Brasil antes de fazer bonito. Depois correu o mundo, plantou sementes e impressionou artistas de renome. Recentemente, até mesmo o deus do Blues, Eric Clapton, se curvou ao seu talento e virou um de seus maiores fãs.
E o nosso Chuck continua balançando a Europa, o Japão e muitos outros cantos. Chamado de louco, esquisito e outras bobagens, mas fazendo uma música ao mesmo tempo simples e sofisticadíssima, totalmente única, e cantando um Brasil que sentimos orgulho por vê-lo revelado. Teve o privilégio de encontrar, como parceiro, um dos maiores compositores populares do século, juntamente com Cole Porter, os irmãos Gershwin e Lennon e McCartney. O maestro que conseguiu, como ninguém, escrever obras elaboradíssimas, mas com toda a pinta de suaves canções populares. Então não deu outra : inventaram a Bossa Nova. Tom Jobim criando as melodias e João Gilberto, o nosso Chuck, descobrindo a fabulosa batida que até hoje ninguém faz.
Não temos um Lennon brasileiro, mas acredito que, se tivéssemos, sua opinião seria idêntica à do inglês :
- Um novo nome para o samba ? - com certeza : João Gilberto ! Ninguém consegue fazer daquele jeito, com aquela atitude .
E, pelo que parece, o homem ainda vai ser moderno - de verdade !- por muito tempo !
Ah, mas o Brasil ...

Um comentário:

Anônimo disse...

Bacana demais logo cedo ligar o rádio e ouvir o Nelson Mota enchendo a bola do CD Belê e do Affonsinho. Disse que o Zum Zum é muito bom e que Belê tambem, aliás, o que não é novidade para nós. Tocou "Gamado pelo samba" e disse ser uma canção gostosíssima, mas eu repito o que disse para nosso cantor :"O CD todo está delicioso, pois foi feito com muito trabalho e amor." Beijos e sucesso para você, Affonsinho.