sexta-feira, maio 19, 2006

"ALL WE NEED IS LOVE!"


Bem, como a música entrou na minha vida não sei ao certo, mas acredito que tenha sido realmente há muito tempo... Dizem que minhas duas avós: D. Helena e D. Dolores cantavam bastante, em Caeté e Diamantina, enquanto cuidavam dos filhos e afazeres domésticos. O pai de D. Dolores, Zeca Bento, era figura muito conhecida na doce e boêmia Diamantina do final do século retrasado, exatamente por seus dotes artísticos. Meu pai costuma afirmar que o Zeca Bento foi a primeira "agência de publicidade do país" ! Diabético, sem uma perna, subindo e descendo ladeiras de muleta, muito pobre e pai de nove filhos, conseguiu sustentar a grande família criando "jingles" publicitários para o pequeno comércio local e também cantando em festas, casamentos e acontecimentos sociais. Quanto espírito de luta! Mas foi há muito tempo. Não sei dizer se eu estava por lá... Minhas primeiras lembranças musicais nesta vida são de meu pai chegando em casa, à noitinha, e eu, bem pequenino, seguindo suas longas pernas, feito um rabinho. Ele chegava alegre, como sempre, e preparava um delicioso e inesquecível "mexidão", ao som eternamente romântico de Nat King Cole. Enquanto saboreávamos nosso maravilhoso jantar, ouvíamos "Fascination", "Unforgettable" e outras coisas tão fascinantes e inesquecíveis quanto. Também me lembro de um dos dias de meus quatro aninhos de vida, quando minha mãe chegou em casa com uma sanfoninha vermelha e branca, meio de verdade, meio de brinquedo. Ali pude sentir, pela primeira vez, a delícia de encostar meus dedinhos de criança em suas teclas e produzir, eu mesmo, uma espécie de mágica do céu: o som musical. Mas, num dia qualquer dos meus seis anos de planeta Terra, meu pai me acordou de manhãzinha e prometeu que me levaria para assistir a um filme com um título bem esquisito: "Help !", de um grupo inglês com um nome mais esquisito ainda : The Beatles. Acho que assistimos ao filme umas dez vezes e conheci ali o meu primeiro ídolo, antes mesmo de qualquer Super-Homem ou Batman. Era um simples (e genial!) mortal, como nós : John Winston Lennon. Alguns dias depois, um amigo de meu pai deu a ele, de presente, um violãozinho um pouco menor do que os usados por gente grande. Morávamos no Rio, em Copacabana, e nunca vou me esquecer deste episódio. Meu pai chegou em casa, sorrindo como sempre e disse : - Meu filho, eu estava na rua, voltando pra casa, quando encontrei o John Lennon, ali pertinho da Confeitaria Colombo, na esquina da Rua Barão de Ipanema. Contei a ele que você o adorava, ele ficou muito feliz e mandou este violão de presente pra você. O mundo parou naquele momento! Nenhum tic-tac de relógio poderia me tirar do transe em que me vi com a mais que fantástica notícia! Então meu pai, meu maior herói, era amigo do meu grande ídolo e, ainda por cima, trazia um presente dele para mim?!!! Eu tinha que fazer alguma coisa urgente com aquilo! Aprendi a afinar o violão com o saudoso Tio Bolivar, que tinha vindo de Belo Horizonte para nos fazer uma visita. Alguns meses depois conheci uns três ou quatro "acordes de Roberto Carlos", com um primo que já sabia como "dominar" o instrumento. Fiz minha primeira musiquinha de amor para uma menina linda da minha sala, que não me dava a menor bola... Muito fraquinha a cançãozinha, mas totalmente sincera. O amor existe muito antes da gente... Nos mudamos para Belo Horizonte quando eu tinha dez anos e a liberdade que a Cidade-Vergel oferecia às crianças me obrigou a guardar o violão num cantinho do quarto por uns tempos e ir viver a vida nas ruas. Jogar bola, bente-altas, bolinha de gude, brincar de polícia e ladrão, queimada, esconde-esconde, tomar banho de chuva, pular na enxurrada, andar de bicicleta, carrinho de rolimã, chupar picolés de sabores esquisitos como: creme de ovos, creme holandês, coco queimado etc., e usufruir do paraíso que a nova cidade ofertava a um típico "menino de apartamento" de Copacabana. Nasci em Belo Horizonte, mas nos mudamos para o Rio quando eu tinha apenas seis meses de vida. Acho que com a chegada da adolescência, ali pelos 14 ou 15 anos, os hormônios começaram a mexer com meus sentidos, minha sensibilidade, minhas dúvidas, inseguranças e então o "anjo da guarda", John Lennon, voltou rapidamente para me salvar. Um dia peguei o quase velho violãozinho e mergulhei fundo num mar de sonhos e amores. Nunca mais consegui acordar. . . Já sabia, nessa época, que o violão não era um presente do Lennon de verdade, mas, de uma certa forma, tenho certeza que era sim ! Como disse o Marcinho Borges: "Os sonhos não envelhecem..." Fui procurar um professor, mas não consegui aquele que me ensinasse as músicas que eu gostava. Encontrei um outro que me ajudou em algumas, mas tive que caminhar sozinho na busca de meus acordes preferidos porque, naquela época, em Belo Horizonte, não tínhamos professores de música "jovem". Só mesmo de violão clássico que, para um adolescente querendo ser pelo menos um pouco "rebelde sem causa", não era a melhor saída. Aprendí a tocar guitarra de verdade nos shows da Rita Lee, dos Mutantes e do Terço, no saudoso Teatro Francisco Nunes, assistindo às três noites das temporadas na primeiríssima fila e tentando guardar na memória as "posições esquisitas" dos dedos dos "professores". Fotografava tudinho na cabeça e, quando chegava em casa, colocava o LP e ficava tentando adivinhar . . . Muito tempo suando a camisa, mas tenho certeza que faria tudinho de novo! Algumas vezes era impossível acertar, mas com o tempo passando, aos poucos, fui conseguindo descobrir os truques e já interpretava algumas canções bem direitinho. Apesar de as melodias terem me levado para o caminho da música, as letras foram as maiores responsáveis pela minha fascinação (olha o Nat King Cole aí de novo - "Fascination" !) pela arte musical. Lembro-me de, aos seis anos de idade, ficar "na cola" de meu pai para que ele me explicasse o que cada sílaba de "Help !" estava dizendo. Por sorte ele sempre foi bom em inglês e me explicava tudinho com a maior "pai-ciência". "Help!" é uma grande letra do Lennon. Lembro-me também de, na adolescência, às vezes trocar noites de festas e farras com a "galera", por horas em casa, sentado, sozinho, com um baita dicionário - Inglês/Português - nas mãos tentando descobrir o que diziam as letras das músicas que eu mais gostava. Dava "foras" terríveis quando apareciam gírias porque os tradicionais dicionários desconheciam as sábias metáforas dos poetas. Mas eu não desistia. Até hoje tenho essa enorme curiosidade. Aos 17 anos fui convidado para a primeira banda e pisei num palco, pela primeira vez aos 18. Outra experiência inesquecível! E então tudo foi acontecendo naturalmente. Comecei a tocar com outras pessoas, fiz amigos e parcerias que duram até hoje, como o meu grande irmão musical, Chico Amaral, que, anos depois, se tornaria o letrista do Skank, banda querida do meu ex aluno de guitarra, Samuel Rosa. Fiz vestibular para jornalismo e estudei na UNB, em Brasília, durante um ano. Voltei à Belo Horizonte e fiz algumas matérias na PUC, mas só fui me formar alguns anos depois, na FACHA, no Rio de Janeiro. No meio disso tudo, dei um tempo e fui para Boston, EUA, estudar música na famosa Berklee College of Music. Mas a saudade do Brasil e dos verdadeiros amigos me trouxe de volta antes do prazo previsto. Voltei ao Rio de Janeiro e fui convidado para participar do movimento conhecido como: "Rock dos Anos 80", integrando o grupo Hanoi Hanoi, onde permaneci por quatro anos viajando por todo o Brasil. Outra experiência fantástica. Dura, mas fantástica! Acontece que quando o meu maior sonho foi finalmente realizado: meu filho chegou ao mundo - , senti que não era mais meu desejo ficar viajando pelo país enquanto o pequenino ensaiava suas primeiras "notinhas" de vida. Deixei o grupo talvez em sua melhor fase, mas não me arrependo nem um pouquinho. Também faria tudo de novo. Troquei os palcos lotados e enfumaçados dos Ginásios e Danceterias pela beirada de seu bercinho iluminado e perfumado. Foi, com certeza, a melhor troca do mundo! Cantei baixinho e muito pra ele dormir tranquilo. Troquei suas fraldinhas, dei mamadeira e brinquei de ser mamãe enquanto a mãe dele de verdade não chegava do trabalho. Só por isso já posso dizer que aproveitei muuuito bem a vida!!! Comprei uma guitarrinha de plástico pra ele e, rapidinho, já estávamos, os dois, cantanto juntinho feito uma dupla totalmente "certa-neja". Mesmo sem ter certeza dessas coisas, mas com um grande respeito, um dia fui levado a uma moça que fazia uma espécie de mapa-astral cármico, coisa bem "papo-cabeça" e um fato me marcou naquele acontecimento. Ela me disse que "via" ali, escrito nos astros, a chegada de um irmãozinho ou um filho, um "ser" que já tinha sido muito meu amigo em outras vidas e que agora estava voltando para que pudéssemos dividir novamente nosso carinho e amizade. Minha mãe já não podia ter filhos, então o "ser" só poderia mesmo ser o meu querido, amado e tãããão desejado filho. E o mais engraçado é que só sei fazer 3 coisas na vida : tocar, escrever e desenhar, e o danadinho, em duas delas, já nasceu muito melhor que eu. Acho que só ganho no desenho ... rssss. Mas é lindo demais ver tudo isso acontecendo ! Um de meus primeiros sonhos, desde pequeno era ter um filhinho e uma filhinha. O primeiro já foi realizado e a menininha continuo pedindo à turma lá de cima para que, se eu tiver merecimento, receba mais essa deliciosa e sagrada responsabilidade. Bom, mas voltando à música, depois que deixei o Hanoi Hanoi montei um estúdio de gravações em casa para ficar mais pertinho de minha "cria". Quando senti que ele estava mais crescidinho voltei a fazer shows, mas somente no Rio, com uma banda que montei por lá. Regressei à Belo Horizonte e fiz meu primeiro CD autoral e totalmente independente - "Tudo Certo ?". No ano seguinte gravei o segundo - "Sambando Assim Meu Rock'n Roll", também autoral e independente. Levei os dois trabalhos para várias gravadoras e nenhuma delas se interessou. Então, só de birra, resolvi fazer um terceiro disco : um presente para as pessoas importantes de minha vida como minha mãe, meu pai, minhas tias, tios, amigos, ex namoradas etc., sem a menor "colher de chá" para qualquer gravadora. Gravamos o Zum Zum, eu e mais dois colegas músicos : violão, baixo e percussão. Tudo bem simples e verdadeiro. E foi aí que o Ronaldo Bastos, grande letrista e parceiro de Milton Nascimento, Beto Guedes, Lo Borges, Tom Jobim, entre outros, um dia me ligou e disse : - Affonsinho, sou o maior fã do seu disco ! Estou indo para Friburgo e ouvindo seu CD o tempo inteiro no meu carro. Montei um selo e quero te contratar ! Um amigo em comum tinha levado uma cópiazinha do CD para ele e depois disso grandes coisas aconteceram. "Zum Zum" foi lançado em 2001, pela DUBAS, no Brasil e no Japão, onde é muito bem executado ! O disco vendeu toda a tiragem e está fora de catálogo, mas a Dubas já está tratando de mandar fabricar mais unzinhos. No ano seguinte, quando começaríamos a gravar um segundo CD autoral, o Ronaldo me ligou com a seguinte proposta : - Affonsinho, por que você não faz um CD com as músicas do Clube da Esquina, mas com essa sonoridade doce e suave do "Zum Zum" ? Respondi que sim, mas que escolheria um repertório que combinasse comigo e faria minhas próprias releituras das canções para que o CD não se transformasse numa espécie de - Clube da Esquina "Cover" ! - O Ronaldo topou e fizemos o "Esquina de Minas, vol I" em 3 meses. O disco vendeu direitinho também e ele me pediu um segundo volume. Eu disse : - Vamos lá ! E os dois "Esquinas de Minas" também foram lançados com sucesso no Japão. Recebo até hoje e-mails carinhosos e matérias lindas sobre os Cds. Vocês precisam ver o jeito doce, "zen" e super poético que os jornalistas japoneses usam para escrever críticas musicais. Enquanto isso eu ia compondo as canções que estão no novo CD - "BELÊ" - que acaba de chegar às lojas ! Foi um disco muito trabalhoso porque eu tinha quase umas 30 novas canções e sofremos muito para escolher as 12 "melhores". É duro tirar uma canção do repertório !! Cada pessoa que ouvia gostava mais de uma específica e, às vezes, era a que a gente tinha classificado como "pior". Foi um ano nessa novela ! Escutávamos tudinho inúmeras vezes na casa do Ronaldo e ele dizia : - Vamos deixar somente essas aqui. Aquelas outras você pode caprichar mais um pouquinho ...
Então eu fazia mais umas duas ou três e partia novamente para nossas demoradas audições. Em julho do ano passado, finalmente, chegamos a um acordo e entrei no estúdio pra valer. Gravamos as vozes, violões e guitarras no meu estúdio. Em seguida a Dubas convidou músicos maravilhosos das bandas do Caetano, Bethania, Ed Mota, Marcos Vale etc. e o disco ficou simplesmente liiindo !! Tive que deixar o trabalho um pouco de lado porque fui convidado para participar, como ator e cantor, na minissérie JK, interpretando um seresteiro e grande amigo de JK, o César Prates. Fiquei na Globo durante os meses de janeiro e fevereiro enquanto o Ronaldo e o Leo, da Dubas, organizavam as gravações do disco. Quando a minissérie terminou e fui ouvir o resultado final, fiquei de boca aberta ! O trabalho deles foi mais que 10, incluindo a capa, que a Dubas trata sempre com o maior carinho ! Se entrarem no site -
www.dubas.com.br - vão perceber o cuidado que eles têm com essa parte também. Bom, e agora começamos mais uma etapa do trabalho : lançar e divulgar o nosso - "BELÊ" - conhecendo pessoas doces, sensíveis e bacanas; pensando em modas para inventar nesse 2006, que promete ! Como cantou, lindamente, em "Beautiful Boy", o meu velho ídolo, John Ono Lennon, para seu filhinho Sean : "Life is what happens to you while you're busy making other plans" ( A vida é o que acontece a você enquanto está ocupado fazendo outros planos ...) Do meu cantinho, com o violão, continuo vivendo, sonhando e acreditando que ALL WE NEED IS LOVE !
Muita saúde, paz e picolés de alegria. Affonsinho.


4 comentários:

Anônimo disse...

Affonsinho... Eu não tinha sabido da sua história não, ein?!!? QUe legal e que ralação para aprender a tocar violão, ein!?!? rsrs... Espero conseguir tocar como você algum dia desses!! E, como você, sou grande admiradora do John... Acho que ele é demais!! Sucesso total! Adorei saber sobre sua vida um pouquinho mais... rsrsrs...
Saudades...
Beijos,
Manu

Anônimo disse...

Meu "old brother" Affonsinho,
Estou emocionado. Encantado!
Seu depoimento,essa breve história de vida,nos mostra como é possível buscar e conseguir a felicidade.
Estou feliz,porque sei que sua estrada vai muito longe e,na sua generosidade,por onde Você passar vai multiplicar e dividir FELICIDADES.
Estou oivindo Nat King Cole, ele diz: "Affonsinho, fly me to the moon..."
Picolés de Alegria pra Você,
belê, pra nós.
Toninho

Anônimo disse...

Meu Querido AFFONSINHO !
Pô cara onde eu encontro o BELÊ.
A foto da capa tá bem THE BEATLES.
Seu nariz até parece com o do LENNON. Toninho, old friend, vai gostar deste comentário. Hoje comprei um som novo e o batizei ao som de PAUL McCARTNEY. CHAOS AND CREATION IN THE BACKYARD. Era prá batizar com o BELÊ, mas... Cadê o BELÊ cara !
Beijos, abraços, paz, amor e saúde e muitos muitos muitos "picolés de alegria", que já esta na boca do povo.

Anônimo disse...

Sou eu de novo.
Quero um autógrafo com dedicatória e tudo mais.